::. Introdução

O movimento rastafari ou rastafarianismo nasceu da conjunção de fatores sociais, políticos, econômicos e culturais. Foram acontecimentos que marcaram uma época de grandes mudanças na consciência de povos do mundo inteiro. Na primeira metade do século XX, os anos de 1900, a humanidade parecia estar vivendo, coletivamente, um processo de revisão e prova de verdadeira evolução. Grandes acertos eram comemorados, como os avanços tecnológicos; por outro lado, erros monumentais eram cometidos; um paradoxo porque, naquele mesmo momento, vozes do mundo inteiro faziam ouvir seus protestos reclamando reparação para as grandes feridas abertas pelas arbitrariedades de incontáveis gerações do passado. 

Neste contexto, os clamores mais veementes partiam do continente Africano, completamente exausto e caótico em conseqüência dos abusos cometidos pela colonização européia. Na África, os movimentos negros emergiam buscando o resgate da auto-estima étnica e cultural e o rastafarianismo apareceu como um ponto de encontro ideológico que oferecia fortes símbolos representativos de valores de indentidade.

A origem filosófico-religiosa da doutrina rastafari é dupla do ponto de vista histórico e geográfico. Por volta dos anos 30, em dois lugares distantes entre si, um mesmo espírito de renovação se erguia. Mobilizações político-culturais que agitavam a Etiópia tiveram uma notável repercussão na Jamaica. Naquela época, a Etiópia era uma monarquia teocrática governada pela mítica dinastia dos descendentes do bíblico rei Salomão, fruto de sua união com a não menos lendária rainha de Sabá (ou Sheba). Esta, governava uma vasta região ao sul daquele país. Estes herdeiros mantiveram a linhagem e o trono ao longo de milênios e em 2 de novembro de 1930, aos 38 anos, Ras Tafari Makonnen foi coroado como o novo governante do império Etíope.



Anos antes, na Jamaica, Marcus Garvey (1887-1940), um militante da causa negra, havia literalmente profetizado o surgimento de um "Salvador", um Messias cuja missão seria resgatar a dignidade das comunidades negras. Garvey foi o criador da Universal Negro Improvement Association, entidade que se tornou porta-voz das insatisfações da classe trabalhadora negra norte-americana. A coroação de Ras Tafari foi recebeu ampla cobertura da mídia internacional. Quando os jornais, estampando a fotografia do rei, chegaram à Jamaica, Garvey declarou que o momento havia chegado. Ras Tafari era o escolhido de Deus. Ao receber do clero etíope (um dos mais antigos da Igreja Cristã Ortodoxa) a coroa, o cetro, o manto dourado e a espada sagradas da disnastia salômonida, o "Príncipe sem Medo" passou a ser chamado de Haile Selassie I - nome que significa "Poder da Divina Trindade". Em Kingstone, as notícias que chegavam sobre os primeiros atos do novo rei repercutiam de modo especial. Muitos cidadãos pertencentes às classes pobres e militantes políticos viram a coroação como a realização de uma das profecias do líder Garvey. Ele afirmara anos antes: "Olhem para a África! Quando um rei for coroado o dia da redenção terá chegado".

O MESSIAS NEGRO

A figura e a história de Haile Selassie estão na base da teologia cristã-rastafari. Na Etiópia, o herdeiro do trono de Davi os tenta, entre outros títulos, os de Rei dos Reis e Senhor dos Senhores. Por seu enorme carisma e forte liderança em favor das nações e etnias oprimidas, em todo o mundo, Selassie começou a ser considerado como "Cristo", em sua significação original, Chrestos, ou seja, ungido, o Filho de Deus, reencarnação do próprio Jesus de Nazaré.

Seu nascimento foi associado a antigas profecias. De fato, Marcus Garvey não foi o primeiro a profetizar a vinda de um Salvador que haveria de redimir os injustiçados. Teólogos analisavam os fatos e encontravam conexões entre Ras Makonnen e previsões contidasna Bíblia católico-cristã, nos livros sagrados dos judeus e nos Evangelhos Apócrifos (textos contemporâneos aos quatro evangelhos oficiais mas desconsiderados pela Igreja Católica Apostólica a Romana). Para os rastafaris, o anunciado retorno de Jesus, ou do Messias, ocorreu em 23 de julho de 1892, quando Ras Tafari veio ao mundo, filho de nobres descendentes da Casa de Davi em terras africanas. Seu pai, Ras Makonnen Wolde Michael era um governador de região, um cargo hereditário. O jovem Tafari foi educado como cristão ortodoxo (da Igreja Ortodoxa do Oriente). Estudou na Etiópia e na França. Era versado nas escrituras sagradas da mais diversas correntes do cristianismo e do judaismo. Conhecia obras raras o Kebra Nagast (A Glória dos Reis), uma Bíblia judaica africana cujo original remonta mil anos atrás, e também o Livro de Enoch, os Livros de Moisés, o Livro do Éden, os 31 volumes da Bíblia hebraica tradicional e os 21 livros canônicos (oficiais) do Novo Testamento. Como futuro governante de um território, foi iniciado nas artes de guerra e na equitação de batalha. "Lig" - Conde Tafari era também Iniciado em mistérios da natureza e diziam que era capaz de conversar com leões e leopardos. 


A DISNASTIA DE SALOMÃO NA ÁFRICA

No Kebra Nagast, conta-se que o Rei Davi, o primeiro govenante judeu do chamado Período dos Reis da história dos judeus, desposou Betsabé, uma descendente de judeus negros. O casal gerou o histórico Salomão, que suscedeu o pai e gerou um filho com a Rainha Sheba (a Rainha de Sabá), imperatriz de terras ao sul da Etiopia. Como legado ao herdeiro, Salomão confiou à Rainha um anel de diamante ornamentado com afigura do Leão de Judah.O garoto foi chamado Menelik, Bayna-Lehkem ou, o "Filho do Sábio", e consta que teria visitado as terras de Israel onde conheceu seu pai e com ele foi iniciado no judaísmo. Foi assim que o Reino de Davi se estabeleceu na Etiópia há três mil anos e a Dinastia, bem como o anel de diamante, atravessaram os séculos até se extinguir com a morte de haile Selassie. Além dos títulos de rei dos Reis (Negus Nagast) e Senhor dos Senhores, o trono etíope agregava outros tantos atributos que reforçavam a autoridade religiosa do imperador; ele era o Leão de Judah, o Eleito de Deus, o Messias Negro. 



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