01/02/2013 Queremos novidade! Uma análise do mercado reggae no Brasil!
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É inegável que para o reggae as coisas caminham um pouco mais lentamente que para outros estilos musicais de maior apelo comercial. Mas será que uma certa discriminação do ritmo pela sociedade, a falta de apoio e a consequente dificuldade financeira e o “fechar dos olhos” da grande mídia para o que acontece, são os maiores fatores responsáveis pela carência de novidades no mercado nacional e internacional?
Não seria cometer um crime afirmar que nos últimos anos, tanto no mercado nacional quanto no internacional, poucas foram as novidades que apareceram e despontaram alcançando um público maior do que o restrito a pequenos eventos locais. No Brasil, enquanto grandes bandas que já estiveram no auge por muito tempo como Cidade Negra e Tribo de Jah deram uma sumida, poucas foram as que despontaram e conseguiram romper as barreiras do seu próprio estado.
(A grande Tribo de Jah, um dos destaques nacionais por longo tempo)
REGGAE NACIONAL: ESTAMOS EM CRISE?
Se formos analisar cuidadosamente, são tão poucas as bandas nacionais hoje que excursionam com frequência pelo país que dá pra se contar nos dedos de uma mão. Isso é tão notório, que grupos como Ponto de Equilíbrio, Mato Seco, Natiruts e Planta e Raiz são praticamente presença garantida, as vezes até simultaneamente, em todos os grandes eventos no território nacional.
Não discutindo a qualidade ou o apelo artístico de cada um desses exemplos ou de outros não citados, o fato é que nos últimos 5 ou 10 anos não só as atrações de renome são as mesmas, mas também as bandas locais acabam se repetindo justamente por serem as únicas a conseguirem reunir mais público. Basicamente neste drama existem três lados – o do público, o do evento e das bandas em ascenção. Mas... será que existe só um culpado?
DE QUEM É A CULPA?
Tentando entender pelo lado dos produtores de eventos surge um dilema. Ao arriscar grandes somas para a realização dos shows, os mesmos precisam de uma certa garantia de venda de ingressos para continuarem o trabalho e evitar prejuízos.
EVENTOS: Como não tem surgido muitas novidades que agregam público, talvez esse seja um dos motivos que geram uma certa "mesmisse" nas grades artísticas dos eventos maiores. No entanto, dar oportunidade para bandas emergentes mostrarem o seu trabalho mesmo que em horários mais cedo deveria ser um exemplo a ser seguido mais frequentemente.
PÚBLICO: O público tem sua parcela de culpa a partir do momento em que não comparece e não apoia os eventos das bandas locais. É comum ouvir pessoas dizerem que só vão aos shows de bandas de reggae locais quando ganham cortesias (e olha que o preço já é bastante acessível). Talvez este seja um dos maiores problemas, pois assim as bandas locais não conseguem formar um público fiel e assim mostrar força para poderem ser convidados e contratados pelos grandes eventos recebendo um cachê de verdade, e não apenas ajuda de custo para transporte como acontece com frequência.
BANDAS: Por último, as bandas também têm uma parcela de culpa a partir do momento em que não buscam meios e métodos de ampliar o seu relacionamento com possíveis fãs, mesmo que nos dias de hoje existam diversas formas de baixo custo para divulgação como a própria internet, muitas vezes mal utilizada.
PROFISSIONALIZANDO
A profissionalização das bandas e a formação de equipes sólidas de divulgação são obrigatórias nos dias de hoje em que a competição por um espaço, não só no mercado reggae, está cada vez mais acirrada, e isso se deve a facilidade de se lançar um trabalho musical. Um computador, um software de edição, microfones razoáveis e pronto! Nasce um artista! Porém muitas vezes, infelizmente, sem preparo, sem polimento e o mais grave... sem talento!
GRINGOS: DA ASCENÇÃO AO DECLÍNIO
Os primeiros shows de artistas estrangeiros de reggae no Brasil começaram a acontecer no final da década de 60, e tomaram corpo a partir da década de 80, quando artistas de rock e da própria música popular brasileira se aproximaram bastante do reggae jamaicano.
Nomes como Titâs, Gilberto Gil, Paralamas do Sucesso, Itamar Assumpção e Luiz Melodia, foram alguns que iniciaram a enraização do ritmo no país, fazendo do reggae o ritmo mais badalado da década de 90. No meio dessa efervescência, não só as pessoas foram conquistadas, mas também grandes patrocinadores e a grande mídia, tanto no Brasil como no exterior, e obviamente que este "fenômeno" gerou uma grande rotatividade de nomes.
(Inner Circle e a explosiva "Sweat")
Sem ordem de relevância, nomes como Jimmy Cliff, Ziggy Marley & The Melody Makers, Inner Circle, Black Uhuru, Israel Vibration, Pato Banton, The Wailers, Alpha Blondy, Joe Higgs, Maxi Priest, Big Mountain, Papa Winnie, Dennis Brown, Gregory Isaacs, Culture, The Gladiators, Burning Spear, The Mighty Diamonds, Lucky Dube e muitos outros, eram presença garantida independente da estação, e quase sempre se apresentando para platéias bastante numerosas.
Porém essa era acabou não só acompanhada pela falência da indústria fonográfica no país, mas também pela doença ou morte de muitos desses lendários artistas. Dos que sobraram, poucos resistiram à saturação do mercado e principalmente à modernização do setor já no início dos anos 2000.
O REGGAE ESTÁ PRONTO PARA A NOVA ERA?
Nos dias de hoje, praticamente a única forma de se informar sobre novos artistas, ou os trabalhos mais recentes das grande lendas, é a internet – dada a deficiência de distribuição de discos no país provocada pela falência da indústria fonográfica tradicional que morreu “abraçada” com a pirataria.
A distribuição digital regulamentada está sendo uma das grandes esperanças para que o mercado volte a se aquecer, e para que as pessoas voltem a ter acesso mais facilmente aos discos dos seus artistas favoritos (novos ou antigos). Um dos veículos que batalham por este fortalecimento é o próprio Surforeggae, que juntamente com o selo Sound System Brazil, está investindo e lançando alguns artistas nas principais lojas de download digital do país, e também nas operadoras de celular (ler notícia).
(Alguns dos grandes nomes lançados pelo selo Surforeggae & SSB)
Este mercado tem crescido de forma surpreendente, assim como a conscientização das pessoas em não comprar CDs piratas ou simplesmente baixar ilegalmente da internet. Apesar desses avanços que estão apenas começando, o mercado de bandas internacionais no Brasil também é visto como "um caso complicado", pois como não existe uma rotatividade muito grande de artistas, já que a grande maioria dos lançamentos não conseguem chegar ao público final, o mercado é dominado por um conjunto restrito de atrações.
Obviamente é algo benéfico para o reggae o fato de grandes artistas como Israel Vibration, Groundation, Dezarie ou Midnite virem duas ou três vezes ao ano à América do Sul – o problema começa a existir a partir do momento em que não acontecem outros shows, e assim as “grades” de artistas internacionais terminam se repetindo da mesma forma que os nacionais.
A realidade é que, nesse caso, o problema é ainda mais complicado. Não é viável trazer bandas internacionais para realizarem apenas 1 ou 2 shows dados os custos de passagens aéreas, vistos, dentre outros gastos imprescindíveis. Então como fazer para que novidades venham ao país e façam apresentações em diversos estados tornando o processo viável?
PARTICIPAÇÃO E INTERESSE
Ultimamente a única fórmula tem sido a “exposição”, seja diretamente mostrando o trabalho do grupo pela primeira vez em grandes eventos para que as pessoas conheçam e se possível assimilem o som, ou ainda realizando um trabalho prévio e minucioso de divulgação. Além de tradicionalmente utilizar canais de comunicação como as rádios, atualmente as redes sociais têm um papel fundamental nesse processo, já que com uma enorme rapidez e versatilidade, é possível atingir cada vez mais pessoas. Nomes como SOJA, Groundation e Midnite vieram ao Brasil nas primeiras vezes ainda pouco conhecidos, e hoje são realidade indiscutíveis no mercado.
(Um dos primeiros shows do SOJA no Brasil em 2007)
Porém essa fórmula exige um certo tempo (cerca de 2 anos ou mais) e um grande investimento por parte das pessoas que realizam esses shows. Mas aí você se pergunta: "Se todos tem culpa, então como fazer com que o mercado seja mais diversificado e atrente?"
Apesar de difícil execução, a resposta é simples: participação e interesse! Duas palavras que atualmente não estão andando juntas. Quando temos eventos interessantes, o público não participa. Ou em outro momento até participa, porém em eventos onde a atração, ou simplesmente o tipo do formato, não são interessantes. Encontrar este equilíbrio é a chave do problema, mesmo que o cenário atual não desperte o tal "INTERESSE".
Enquanto isso, esperamos que cada leitor se questione e pense no que pode ser feito para que os problemas aqui relatados sejam pelo menos diminuídos. Há muita arte e artistas por aí... e também muita gente sedenta por boas novidades. Que Jah saiba juntar estes dois elementos para a saúde de nossa tão amada música reggae.